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EDITORIAL

O fim de uma excrescência


O fim de uma excrescência

Está a caminho do ocaso uma excrescência adotada há muito na política brasileira: o voto proporcional para deputados e vereadores. O primeiro passo foi a aprovação, no último dia 12, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, da proposta de emenda à Constituição (PEC) 54/07.

De autoria do senador Francisco Dornelles (PP/RJ), a dita prevê que deputados e vereadores devem ser eleitos da mesma forma como o são os candidatos aos cargos do Executivo (presidente da República, prefeitos e governadores) e do Senado. Ou seja: ganhou na urna, levou. Sem subterfúgio ou lengalenga. 

Pelo voto proporcional hoje vigente, nem sempre o candidato mais votado, que detém a confiança do eleitorado, é confirmado no cargo. Dependendo do tal coeficiente eleitoral, mesmo aclamado por uma grande maioria, o escolhido pode dar lugar a um ilustre desconhecido que, por mera coincidência ou oportunismo, tenha disputado a eleição por um partido ou coligação fortes.

O voto proporcional foi instituído pela Lei 4.737 de 15 de julho de 1965 (início do regime de exceção), num momento em que os políticos de oposição eram completamente descoordenados. Era cada um por si. Já a situação, a extinta Arena (Aliança Renovadora Nacional), o partido que detinha a supremacia eleitoral do País.

Assim, o voto proporcional servia como luva aos propósitos dos militares que usurpavam o poder. Era o caminho legítimo para eles continuarem mantendo a hegemonia política, alijando do processo de escolha nos estados e municípios os candidatos da oposição.

Dessa forma, os candidatos que compunham a minoria partidária jamais alcançavam o tal quociente eleitoral. Em outras palavras, diante de uma competição injusta, ainda que o candidato oposicionista arrebanhasse elevado número de eleitores, fiéis à sua plataforma política, sempre ficava de fora porque não atingia o número de votos estabelecido.

A democracia brasileira só tem a ganhar com a aprovação de mais esse instrumento de lapidação. Afinal, é difícil explicar ao eleitor o porquê de seu candidato, com um número bem superior de votos, ficar de fora do parlamento, enquanto um candidato nanico qualquer posa de “o cara!”, em razão de ter sido levado pelo beiço feito peixe por um campeão de urnas.

Exemplo dessa pernóstica maneira de tratar a vontade soberana do eleitor, como se ela nada valesse, está na pessoa do falecido Enéas Carneiro, “the flash” que criou o bordão “Meu nome é Enéas!”. Enéas foi eleito deputado federal pelo estado de São Paulo, em 2002, recebendo votação recorde de mais de 1,57 milhão de votos.

Naquela ocasião, o caçuá dele, que era fundador do Prona (Partido de Reedificação da Ordem Nacional),  transbordou, graças à popularidade que adquirira como candidato à Presidência da República, permitindo levar consigo para a Câmara, em Brasília, cinco ilustres desconhecidos da política paulistana. Bom frisar, esses cinco obtiveram cada um menos de mil votos nas urnas. 

Enquanto isso, personalidades que gastaram sola de sapato no corpo a corpo da campanha, puseram no colo um sem-número de criança sujinhas, quase gastaram a mão de tantos cumprimentos, enfim, trabalharam duro, e, por isso, muito bem votadas, ficaram a ver navios.

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