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Homenagem

Não tenho lágrimas


Não tenho lágrimas

Aroldo Pinheiro

O ar sério, carrancudo, e o jeitão de quem carrega o rei na barriga escondiam uma pessoa afável e de humor apurado. Inteligente, amigo das coisas boas, durante muito tempo ele manteve sincera amizade com dois escoceses famosos: Johnnie Walker e Old Parr. É. Ele era bom de uísque e duro na queda.

Os canais que irrigam o corpo humano são traiçoeiros. Walter Melo foi surpreendido por um AVC que, aos poucos, o prendeu à cama. Foram mais de dez anos lutando para que ela, a ceifadora de vidas, se mantivesse à distância.

Um mosquito, um insignificante Aedes aegypti derrubou o guerreiro. Na madrugada do dia 12 de maio, a morte o levou.

Walter Melo chegou a Boa Vista na década de 1950. Participou ativamente da construção deste Estado. Ente outras coisas, foi diretor da Divisão de Obras (atual Secretaria de Infraestrutura), foi o primeiro presidente e implantador da Centrais Elétricas de Roraima - que, sob seu comando e administração, passou a gerar energia ininterrupta para nossa cidade -, coordenou os trabalhos de construção da ponte sobre o rio Cauamé (ainda de madeira, 1200 metros), batalhou e conseguiu, com um grupo de amigos, instituir o primeiro serviço público de telefonia boa-vistense. Com teodolito e barras zebradas fez levantamentos topográficos para estradas que rasgam Roraima de Norte a Sul.

Os primeiros estudos para construção de uma hidrelétrica em Roraima? Adivinhem quem estava lá “no” Paredão? Walter Melo, é claro.

No tempo em que ainda se acreditava que nossas riquezas seriam retiradas do rico subsolo, Walter Melo idealizou e participou da construção do Monumento ao Garimpeiro, aquele que, pintado em cores ridículas, desrespeitando o projeto original, serve de pano de fundo para fotos turísticas.

Da minha infância, do terreno ao lado, do bangalô ocupado pela família Melo, de eletrola Telefunken vem à minha mente um incrível dueto formado por Anísio Silva e Nat King Cole: “Quero chorar / não tenho lágrimas / que me rolem na face / pra me socorrer...”

Adeus, seu Walter.

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