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Governo quer prender quem divulgar grampo
O governo pretende aproveitar o ambiente criado pelo recente caso de espionagem envolvendo empresas de telefonia para apressar o debate e a aprovação de uma lei que punirá com até quatro anos de prisão, mais multa, quem divulgar o conteúdo de grampos telefônicos. O anteprojeto está no Ministério da Justiça e pode ser enviado ao Congresso quando deputados e senadores voltarem do recesso, no mês que vem.

FERNANDO RODRIGUES Folha de S. Paulo O governo pretende aproveitar o ambiente criado pelo recente caso de espionagem envolvendo empresas de telefonia para apressar o debate e a aprovação de uma lei que punirá com até quatro anos de prisão, mais multa, quem divulgar o conteúdo de grampos telefônicos. O anteprojeto está no Ministério da Justiça e pode ser enviado ao Congresso quando deputados e senadores voltarem do recesso, no mês que vem. O escopo principal será regulamentar de maneira mais estrita os monitoramentos telefônicos. No mesmo texto, entretanto, o governo pretende restringir a divulgação do conteúdo de conversas gravadas -legal ou ilegalmente. Hoje, há controvérsia no meio jurídico a respeito da divulgação do conteúdo de um grampo de telefônico por um jornal. Esta Folha, por exemplo, considera que a transcrição de uma conversa deve ser divulgada quando há notório interesse público envolvido. Um exemplo foi o grampo ilegal de telefones na sede do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em 1998, durante o processo de privatização das empresas de telefonia. A Folha teve acesso ao material, gravado em mais de 40 fitas. As informações pessoais foram descartadas, mas o jornal optou por divulgar as conversas entre o então presidente Fernando Henrique Cardoso e seus assessores quando tratavam da venda das estatais. Ao ser indagado se seu nome poderia ser usado na montagem de um dos consórcios, FHC respondeu: "Não tenha dúvida, não tenha dúvida". O anteprojeto que o governo Lula pretende patrocinar vai além da punição para quem divulga conversas telefônicas gravadas de forma ilegal ou por meio judicial. Se aprovado pelo Congresso, haverá restrição para que sejam gravadas conversas pessoais sem que todos os interlocutores estejam de acordo. Hoje, a lei do país é omissa a respeito deste tema. Com a nova regra, será punido com até três anos de reclusão, mais multa, quem "divulgar gravação de conversa própria, por telefone ou por outro meio, gravada sem o conhecimento do interlocutor". Ao final da redação, existe um complemento ambíguo: "Salvo para o exercício regular de um direito". Não fica claro no texto qual seria esse "direito". Pelo que a Folha apurou, a ressalva serviria para alguém se precaver em alguma disputa. Por exemplo, um consumidor que se sinta lesado por um prestador de serviços poderá gravar a conversa para registrar sua negociação e cobrar seus direitos na Justiça. Não fica claro, entretanto, se um eleitor poderá gravar o que diz um político em um almoço de campanha para depois cobrar o cumprimento de uma promessa. O que fica certamente proibido, ouviu a Folha, são as reportagens em que jornalistas usam câmeras ocultas ou gravadores ocultos. O pretexto inicial para produzir uma nova lei sobre grampos telefônicos foi regular esse tipo de atividade quando há uma ordem judicial. Hoje, delegados de polícia solicitam o monitoramento aos juízes, que quase sempre autorizam sem saber ao certo a quem pertencem todos os telefones citados no pedido. Se for aprovada a lei em discussão dentro do governo Lula, o delegado terá de apresentar mais argumentos para convencer o juiz. O magistrado, por sua vez, ficará co-responsável pelo processo. As empresas telefônicas terão de se adaptar para permitir que o policial e o juiz monitorem remotamente a gravação, que será em meio digital. Haverá senhas de acesso e será possível saber quem teve acesso ao material. Em tese, isso tornará mais difícil o vazamento -e mais fácil a identificação de quem tentar divulgar as conversas gravadas.
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